A Baia da Ilha Grande no Censo 2022: primeiros resultados

Os primeiros dados do Censo Demográfico 2022 foram publicadas e permitem estabelecer um panorama do território da Baia da Ilha Grande e da sua dinâmica nas últimas décadas. A Baía da Ilha Grande é composto pelos municípios de Mangaratiba, Angra dos Reis e Paraty.  Corresponde a uma das 8 regiões de governo do estado do Rio de Janeiro que responde a denominação de Costa Verde. Os resultados iniciais do Censo 2022 disponibilizam informações sobre a evolução e a distribuição da população e dos domicílios brasileiros. A análise apresentada aqui mostra que a Baía da Ilha Grande se apresenta como uma das regiões particularmente dinâmicas do Estado, e indica mudanças importantes na dinâmica demográfica da região. Esse texto será complementado por um outro que analisa um segundo conjunto de informações sobre as pessoas e territórios indígenas e quilombolas na Baía da Ilha Grande.

 

Dinâmicas populacionais contrastadas dentro da Baía da Ilha Grande

Uma população fortemente concentrada em Angra dos Reis

De acordo com os dados do Censo, a Baía da Ilha Grande apresentou 252 510 habitantes em 2022, o que corresponde à 1,6% da população total do Estado. Segundo o Gráfico 1, dois terços da população da região se concentram no município de Angra dos Reis (167 418), 18% em Paraty (44 872) e 16% em Mangaratiba (41 220). Essa distribuição traduz o peso econômico de Angra dos Reis, que constitui o principal polo de bens e serviços da região. Ainda segundo o IBGE, Angra dos Reis é o município com maior densidade demográfica da Baia da Ilha Grande, 205,2 habitantes/km2 contra 120,43 habitantes/km2 para a Baía da Ilha Grande. Paraty apresenta uma densidade demográfica somente de 48,55 habitantes/km2 (sendo o município com maior área territorial da região), enquanto Mangaratiba tem uma densidade de 112,13 habitantes/km2.

 

Gráfico 1: Distribuição da população da Baia da Ilha Grande em 2022. Fonte: IBGE, Censo 2022

 

Entre 2010 e 2022, a população da Baía da Ilha Grande cresceu quase 10 mil pessoas, representando um incremento de 4% (Gráfico 2). Nem todos os municípios ganharam habitantes, embora não houve alterações na hierarquia. Assim, se Mangaratiba e Paraty apresentam um aumento de população nos últimos 12 anos (+12,6% e 19,5% respectivamente), não é o caso de Angra dos Reis que perdeu um pouco mais de 2.000 habitantes.

 

Gráfico 2: População da Baia da Ilha Grande em 2010 e 2022. Fonte: IBGE, Censo 2022.

 

Taxas de crescimento da população em declino que marcam uma ruptura na dinâmica demográfica de Angra dos Reis

Apesar do aumento da população, a Baia da Ilha Grande registra uma forte redução do ritmo de crescimento desde 2010 (Tabela 1). Essa tendência não é própria a região. A diminuição das taxas de crescimento populacional é observada desde a década de 1960 no país e no estado do Rio de Janeiro, e se aprofundou particularmente na última década. Assim, entre 2010 e 2022, o crescimento demográfico do país foi de 0,54% ao ano, enquanto aquele do Estado passou de 1,30% ao ano no período 1991-2000 para a 0,03%.

Mesmo apresentando uma diminuição do crescimento da população, a Baia da Ilha Grande permanece como uma região do Estado particularmente dinâmica do ponto de vista demográfico. Desde a década de 1990 pelo menos, a região mantém um ritmo de crescimento bastante elevado, muito superior à média do Estado.

 

Tabela 1: Taxas de crescimento anual da população entre 1991 e 2022. Fonte: IBGE, Censo 2022.

 

O Censo 2022 sugere também algumas mudanças importantes com relação a dinâmica demográfica interna da Baía da Ilha Grande. Como já foi dito, Angra dos Reis apresentou na última década um decréscimo da população correspondendo a uma taxa negativa de -0,10% ao ano, evidenciando uma ruptura na trajetória demográfica da cidade. Até então, mais ou menos desde a década de 1950, Angra dos Reis experimentava um período de um forte crescimento populacional, superior a 3,2% ao ano, durante o qual a população do município duplicava a cada 20 anos. Apenas entre 2000 e 2010, por exemplo, a população aumentou de 50 mil habitantes, na sua maioria oriunda de outros lugares.

Apesar dos dados disponíveis ainda não serem suficientes para explicar de forma definitiva a diminuição de população de Angra dos Reis, podemos emitir algumas hipóteses. Globalmente, a taxa de crescimento natural vai diminuindo, mas é uma tendência geral ao Brasil como um todo, não especifico à Angra dos Reis. Outro fator que pode explicar a diminuição da população estaria relacionado a saída de habitantes para outros municípios. Traduziria uma certa perda de atratividade da cidade durante a última década que seria a consequência da degradação do mercado do trabalho devido à crise econômica e do aumento da insegurança, amplamente divulgado nas mídias.

Ao contrário, Paraty, e em menor medida Mangaratiba, continuam a apresentar um crescimento elevado (1,5% e 1,0% por ano), bem superior à média do estado do Rio de Janeiro. Paraty é o oitavo município do estado do Rio de janeiro com maior crescimento populacional entre 2010 e 2022, e o primeiro município localizado fora da região dos lagos cujo dinamismo está diretamente atrelado às atividades de produção de petróleo. E Mangaratiba é o décimo quinto sobre um total de 94 municípios. O crescimento da população pode ser associado ao dinamismo da atividade turística como veremos a seguir, mas também, e precisaremos confirmar essa hipótese, a imigração de moradores de grandes cidades (como Rio de Janeiro, que perdeu também população entre 2010 e 2022) em decorrência da pandemia e do crescimento do trabalho remoto entre alguns setores da população.

Em ambos os casos, Angra dos Reis e Paraty, as hipóteses deverão ser verificadas com a divulgação de dados mais completos do Censo 2022, em particular sobre migrações.

 

Crescimento dos domicílios de uso ocasional e o peso do turismo de segunda residência

Os primeiros resultados do Censo 2022 disponibilizam também informações sobre os domicílios, que permitem evidenciar, em particular, o peso da atividade turística na região. Em 2022, a Baía da Ilha Grande possuía um total de 162.902 domicílios, concentrados por mais da metade em Angra dos Reis (57,6%), um quarto em Mangaratiba (26,8%) e 15,6% em Paraty (Tabela 2). Em relação ao estado do Rio de Janeiro, a Baía da Ilha Grande reúne 2,1% do total de domicílios enquanto concentra apenas 1,6% da população.

Crescimento dos domicílios superior a população 

No que diz respeito a evolução na última década, observa-se um aumento expressivo do número de domicílios na Baía da Ilha Grande (+37,1%), acima da média do estado (+25,3%). Paraty apresentou entre 2010 e 2022 a maior taxa de crescimento de domicílios (+60,6%) na região, revelando a intensa expansão imobiliária neste município. De forma geral, observamos um descompasso entre o aumento dos domicílios e da população. Isso é particularmente evidente no caso de Angra dos Reis, pois a população do município diminuiu na última década (-1,23%) enquanto o número de domicílio aumentou de 31,1%. Em Paraty e Mangaratiba também, o aumento dos domicílios é bem superior ao crescimento da população.

 

Tabela 2: Domicílios na Baía da Ilha grande, 2022. Fonte: IBGE, Censo 2022.

 

Essas tendências já são observadas há algumas décadas no Brasil, mas parece ter se ampliado nos últimos 10 anos. Assim ao nível nacional, o número de domicílios cresceu de 34% entre 2010 e 2022, enquanto a população cresceu de 6,5%.

 

O peso significativo dos domicílios de uso ocasional

Outro elemento a ser destacado é a importância dos domicílios vazios na região. Como podemos observar menos de 60% dos domicílios na Baía da Ilha Grande eram ocupados em 2022, uma proporção muito inferior à média estadual (79,9%). Em Mangaratiba, somente um terço do total de domicílios era ocupado em 2022 (36,1%) contra dois terços em Angra dos Reis e Paraty.

Os domicílios não ocupados reúnem os domicílios não ocupados de uso ocasional e os domicílios vagos. Na Baía da Ilha Grande, como mostra o Gráfico 3, os domicílios não ocupados são em grande parte domicílios de uso ocasional, como as segundas residências ou as casas de veraneio. Assim, em 2022, um pouco mais de 30% dos domicílios da região é de uso ocasional, ou seja, uma a cada três residências. Essa situação reflete a importância da atividade do turismo na região.

 

Gráfico 3: Proporções dos domicílios de uso ocupacional e dos domicílios vagos em 2022. Fonte: IBGE, Censo 2022.

 

Mangaratiba se destaca em particular, já que as casas de veraneio representam a maioria dos domicílios (54,7%) e o município reúne quase a metade dos domicílios desse tipo da região (46,8%). A proporção de segunda residência é também significativa em Paraty (28,8%) e Angra dos Reis (21,2%) demonstrando a importância da atividade turística em toda a região. Angra dos Reis apresenta também uma percentagem significativa de domicílios vagos (12,5% do total dos domicílios do município), concentrando mais dos dois terços dos domicílios vagos na região. Essa proporção elevada dos domicílios vagos pode traduzir o perfil mais diversificado do município e a maior presença do setor secundário em relação aos outros municípios da Baia da Ilha Grande.

Além disso, podemos observar um forte crescimento dos domicílios de uso ocasional na última década (Tabela 3). Dessa forma, o aumento dos domicílios que ocorreu entre 2010 e 2022 na Baia da Ilha Grande é relacionado, em grande parte, ao fortalecimento atividade turística. Em Paraty, onde a expansão imobiliária foi particularmente forte, o aumento dos domicílios de uso ocasional foi de 142,1%, sua proporção passando de 19,1% em 2010 a 28,8% em 2022. Essa tendência não é restrita à região, pois os domicílios de uso ocasional aumentaram de 6,2% em 2010 a 13,1% em 2022 no Estado do Rio de Janeiro (+162,1%). Em Angra dos Reis, é o aumento dos domicílios vagos que se destaca (+129,3), cuja proporção passou de 7,1% a 12,5% entre 2010 e 2022. A crise econômica que afetou particularmente o município e a diminuição da população durante a última década poderiam explicar esse resultado. No entanto, ainda é necessário aguardar a divulgação de dados mais completas do censo para ter maior clareza.

 

Tabela 3: Taxas de crescimento dos domicílios não ocupados na Baía da Ilha grande, 2010-2022. Fonte: IBGE, Censo 2022.

 

 

Conclusão

Os primeiros dados do Censo 2022 trazem informações interessantes sobre a Baía da Ilha Grande e sua evolução na última década, que possam ser a base da elaboração e implementação de políticas públicas de gestão e planejamento do território.

Dentro das principais conclusões, podemos destacar a diminuição da população de Angra dos Reis que constitui uma ruptura na trajetória da cidade em relação a décadas de crescimento demográfico intenso. Ao contrário, Paraty experimentou um aumento significativo da sua população, classificando-se como um dos municípios do estado que mais cresceu nos últimos 12 anos. Outro resultado a salientar é o peso dos domicílios de uso ocasional (segunda residência, casa de veraneio, etc.), responsáveis em grande parte da expansão imobiliária na região, e que vem evidenciar o impacto significativo do turismo na dinâmica territorial da Baia da Ilha Grande. O caso de Mangaratiba é particularmente esclarecedor sobre esse aspecto.

Resta esperar a divulgação dos dados detalhados do Censo Demográfico 2022 que serão indispensáveis para melhor compreensão das evoluções observadas e para afinar as analises.

 

*Agrademos a professora Monika Richter pelos comentários sobre uma primeira versão desse texto. Os resultados apresentados contaram com a participação do bolsista e graduando em geografia Diego Sousa.

 

 

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